Greve que antecedeu CLT teve participação fundamental de mulheres

A Greve de 1917, marco na história da luta e consolidação dos direitos da classe trabalhadora no Brasil, foi impulsionada em parte por mulheres. Elas ocupavam cargos de operárias na época, especialmente, na indústria têxtil.

A economista e pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Marilane Teixeira, ressalta que as mulheres têm peso relevante na formação da classe operária brasileira, mas recorrentemente são invisibilizadas nesses processos de lutas.

“Quando se estuda no Brasil a história da classe operária, ela normalmente é vista sob o ponto de vista masculino, raramente tem uma abordagem que inclua as mulheres nessa luta. Normalmente, [os estudos] são realizados por pesquisadoras mulheres. Quando são pesquisadores homens, as mulheres são absolutamente invisibilizadas”, avalia Teixeira.

Neste 1º de maio, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) completa 80 anos. A legislação foi criada pelo Decreto-Lei 5.452 de 1943 e sancionada pelo presidente Getúlio Vargas, durante o Estado Novo. A CLT unificou a legislação trabalhista existente no país até então.

Neste marco, a Agência Brasil publica reportagem especial que retoma os antecedentes históricos para a conquista desses direitos, as mudanças ao longo do tempo e o atual cenário do mundo do trabalho, especialmente diante da digitalização.

Mundo do trabalho

A economista Marilane Teixeira destaca que a afirmação de que as mulheres só se inseriram no mundo do trabalho a partir dos anos 60 e 70 é um mito. “Isso se intensificou, de fato. Elas se inseriram de forma mais massiva a partir dessa época e se mantiveram no mercado de trabalho. Essa é a diferença do período anterior: as mulheres entravam e saíam do mercado de trabalho por conta da maternidade”, disse.

São Paulo (SP), 24/04/2023 - Fachada da antiga sede da indústria têxtil Cotonifício Rodolfo Crespi, onde ocorreu a paralisação de trabalhadores que deu origem à greve geral de 1917, na Mooca. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

São Paulo (SP), 24/04/2023 – Fachada da antiga sede da indústria têxtil Cotonifício Rodolfo Crespi, onde ocorreu a paralisação de trabalhadores que deu origem à greve geral de 1917, na Mooca. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Elas estiveram mais presentes na indústria têxtil e de confecções, espaço que foi palco fundamental de reivindicações na Greve de 17. Ainda hoje,  segundo a pesquisadora, a ocupação de mulheres segue alta, representando 75% dos trabalhadores do setor. Naquele momento, 90% dos operários eram mulheres, e os homens estavam em sua maioria nos cargos de encarregados ou de chefia.

Até a segunda metade do século 20, a luta da classe operária estava predominantemente concentrada no setor têxtil. “Por exemplo, o direito a salário igual para trabalho igual é uma reivindicação que tem mais de 100 anos. As mulheres denunciavam as condições de desigualdade e que se vivenciava dentro do ambiente de trabalho, quando elas realizavam trabalho igual a um homem, idêntico, e os salários delas eram muito inferiores.”

A luta das mulheres não era apenas por condições de trabalho dignas, mas para participarem das manifestações coletivas por direitos sem a hostilidade de seus pares do sexo masculino. “Na formação da classe operária, as mulheres eram vistas como se estivessem fora do lugar, ou seja, lugar de mulheres não é na fábrica, não é trabalhando como operárias, lugar da mulher é na casa, no lar e cuidando da família e dos filhos.”

Processo tardio

Para a desembargadora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4) Magda Biavaschi, a consolidação das leis do trabalho foi um processo lento e caminhou junto com a industrialização porque o Brasil é um país de capitalismo tardio, conforme tese do professor João Manuel Cardoso de Melo, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tendo em vista que as origens da proteção social do trabalho remontam à lógica do sistema capitalista.

“As raízes de toda essa legislação de proteção social do trabalho estão fincadas no século 19, quando na grande indústria inglesa, o capital industrial superou o capital comercial e se autonomizou e saiu mundo afora movido por seu desejo insaciável de acumulação de riqueza abstrata, que move o capitalismo”, disse.

Ela aponta que a ideia era conter a lógica de exploração capitalista. “Nesse processo, ele [o capitalismo] busca dissolver todas as relações sociais ou todos aqueles obstáculos que impedem o seu livre trânsito e o faz onde não há vínculos ou onde não há diques suficientes para contê-lo e onde não há vínculos suficientes nas sociedades para esse processo de resistência”, acrescentou.

Nesse sentido, a sociedade observava que o modo de produção capitalista aprofundava e acirrava desigualdades sociais e que a promessa da Revolução Francesa, de uma sociedade de homens livres, fraternos e iguais, não estava sendo cumprida, o que levou à mobilização não apenas da classe operária, mas de intelectuais e de setores da Igreja. “O resultado dessa pressão, dessa luta e dessa demanda foram, no campo do trabalho, a produção de normas de proteção social ao trabalho.”

A magistrada argumenta que esse processo não se deu no Brasil naquele momento histórico, porque vivíamos a escravidão, o trabalho compulsório, e a abolição – no papel – ocorreu apenas em 1888. “Mas os trabalhadores, agora os homens e as mulheres negros e negras recém libertos, foram relegados a sua própria sorte e as políticas de migração fortalecidas só fizeram acirrar ou aprofundar este problema, portanto, se diz que o mercado trabalho brasileiro foi constituído sob o signo da exclusão social.”

A desembargadora acrescenta que o sistema público de regulação do trabalho passa a ser constituído visando não deixar ninguém à mercê da “força bruta do capital” e que o Brasil precisava superar suas heranças coloniais, que até hoje ainda estão presentes.

“E que heranças coloniais são essas? As nossas heranças patriarcais, escravocratas e monocultoras. O Brasil precisava superar essas heranças e esse processo foi um processo hercúleo, difícil, e que demandou a força dos nossos instintos e a força dos movimentos, reivindicando para que essa positivação dessas normas se desse.”

Quem ficou de fora

A pesquisadora da Unicamp Marilane Teixeira aponta que a CLT foi aprovada em um momento histórico em que o país estava se desenvolvendo e se industrializando, formando uma classe operária industrial, principalmente na Região Sudeste, o que fez com que fosse pensada para um contingente muito pequeno da classe trabalhadora brasileira: urbana e industrial.

“Ela [CLT] não chegou de graça, não foi uma dádiva do governo Getúlio Vargas. Ela foi resultado de pressão e de luta social muito importante que se travou por uma classe operária que estava se formando, estava se consolidando no início do século 20 no Brasil, muito influenciada evidentemente pelos imigrantes italianos, pelos imigrantes espanhóis, que tinham um peso muito grande nessa indústria nascente.” Essa classe operária trazia uma experiência de alguns países, principalmente Espanha e a Itália.

No entanto, ela avalia que um problema da CLT é justamente ter sido pensada para o esse espaço urbano e para uma classe operária industrial ainda em ascensão. “Excluía toda a parte do trabalho rural, que só teve seus direitos reconhecidos a partir dos anos 60 e consolidados na Constituição de 88. A própria trabalhadora doméstica, que também não tinha os seus direitos reconhecidos, e um volume enorme de pessoas que viviam do trabalho por conta própria, da precariedade, do trabalho informal e que não eram absorvidos pela CLT.”

“Então, quer dizer, ganhou essa parcela da classe operária que teve direito ao salário mínimo, teve direito a uma série de conquistas e de lutas que foram consolidadas. Mas quem perdeu? Quem perdeu foi quem não foi incorporado nessa teia de proteção social que infelizmente foi idealizada apenas por uma parcela muito pequena da classe trabalhadora”, acrescentou.

Plataforma integrada é alternativa à “uberização”, aponta especialista

Multidões de trabalhadores informais, socialmente desprotegidos que passam a ser controlados, gerenciados e subordinados a empresas que formam oligopólios nos setores em que atuam. Este é o resultado do fenômeno da uberização, segundo a socióloga Ludmila Abílio, pesquisadora do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo (USP), que destacou como característica desse modelo o trabalho sob demanda.

O motorista Jonas Eduardo Ferreira começou a trabalhar por meio de aplicativos de transporte após demissão em 2020, primeiro ano da pandemia. “Eu sempre trabalhei CLT [formalizado] minha vida toda, na pandemia por falta de emprego CLT eu tive que migrar para o autônomo, que seria o aplicativo.”

São Paulo (SP), 28/04/2023 - O motorista de aplicativo Jonas Ferreira fala sobre os prós e contras do trabalho autônomo. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

São Paulo (SP), 28/04/2023 – O motorista de aplicativo Jonas Ferreira fala sobre os prós e contras do trabalho autônomo. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil – Rovena Rosa/Agência Brasil

“Como a gente não tem registro, quando fica doente, o carro quebra, alguém da família precisa de você, como é que faz? Não faz. Porque a gente tem que fazer nosso próprio salário, nosso próprio 13º, nossas próprias férias, a gente tem que se programar pra isso. É o que eu tento fazer, eu sempre tento deixar um dinheirinho reservado para essas horas”, contou Ferreira.

Para fazer jus à aposentadoria, o trabalhador tem contribuído ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) como Microempreendedor Individual (MEI), mas reforçou que não há outras garantias trabalhistas. “Minha aposentadoria eu penso em tentar juntar um dinheirinho, que é difícil também, e pagando a MEI. Fora isso, não temos garantia nenhuma.”

Em contraposição a esse modelo, cientistas trabalham em uma solução prática. A advogada Paula Freitas, coordenadora da Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista (Remir), fez parte de um grupo que trabalhou na construção de uma plataforma que tenta mudar o foco dos contratos das empresas para o trabalhador autônomo controlado por plataformas digitais, permitindo a regulação dos direitos para pessoas com múltiplos empregos.

Neste 1º de maio, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) completa 80 anos. A legislação foi criada pelo Decreto-Lei 5.452 de 1943 e sancionada pelo presidente Getúlio Vargas, durante o Estado Novo. A CLT unificou a legislação trabalhista existente no país até então. Neste marco, a Agência Brasil publica reportagem especial que retoma os antecedentes históricos para a conquista desses direitos, as mudanças ao longo do tempo e o atual cenário do Mundo do Trabalho, especialmente diante da digitalização.

Alternativa

A plataforma Integra Brasil proposta pelo Remir poderia ser utilizada para gerenciar horas trabalhadas e calcular os valores que cada empresa deveria arcar em relação aos direitos trabalhistas. O projeto surgiu como resultado do doutorado de Freitas, coordenadora da rede, e pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

“A nomenclatura [relações de trabalho ou trabalhadores gerenciados por meio de plataformas digitais] é importante porque estabelece um fundamento de que essas relações de trabalho são firmadas com empresas que exploram setores tradicionais da economia como, por exemplo, da entrega e também de motorista, transporte de passageiros, entretanto, no modelo de negócio, elas organizam a produção, o processo de trabalho, incorporando plataformas digitais.”

Ela avalia que é um modelo de negócio novo, em que a organização da força de trabalho é feita dos aplicativos, que são essas plataformas digitais, o que difere do funcionamento do trabalho tradicional na indústria ou mesmo no setor de serviços.

“O regime jurídico que a gente reconhece é o vínculo de emprego, porém com uma nova reconfiguração, porque não é mais o vínculo de emprego para um empregador, mas é o vínculo de emprego para multiempresas. E isso acaba trazendo uma perspectiva de que a gente tem que manter os direitos trabalhistas, tem que manter a proteção social e do trabalho como fundamento, tal como a CLT já pregava desde a sua fundação, mas adaptando a essa realidade”.

A proposta é que essa adaptação seja feita considerando a soma dos tempos de atividade do empregado para as múltiplas empresas e dividindo os custos sociais e do trabalho conforme o tempo que ele efetivamente atuou para cada empresa.

São Paulo (SP), 28/04/2023 - O motorista de aplicativo Jonas Ferreira fala sobre os prós e contras do trabalho autônomo. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

São Paulo (SP), 28/04/2023 – O motorista de aplicativo Jonas Ferreira fala sobre os prós e contras do trabalho autônomo. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil – Rovena Rosa/Agência Brasil

“Para que se possa fazer essa contagem, formalizar esse trabalho e garantir a fiscalização do trabalho, a ideia que a gente traz é de fazer uma plataforma pública e governamental, a Integra Brasil, que espelha as informações das atividades realizadas e que integre essas informações.”

Para o motorista Jonas Ferreira, uma plataforma nesses moldes já deveria estar em funcionamento, pois a modalidade de motorista por aplicativo se estende por anos. No entanto, ele acredita que a garantia de direitos para a categoria ainda está distante. “Se nós tivéssemos um registro em carteira, mesmo que fosse um salário mínimo, já estaria bom, porque a gente teria os benefícios, mas nesse caso do aplicativo não tem benefício. Você trabalha o dia que você quer, o dia que você pode, você faz seu horário. A vantagem é essa, a desvantagem é que não tem garantia nenhuma.”

Em relação ao desejo das pessoas de se verem livres da figura do patrão que pode levar à adesão às plataformas, Ludmila Abílio, acrescenta que alguns trabalhadores, no período pré-uberização, viram na profissão de entregadores uma melhor remuneração e uma relação diferente com a cidade diferente. “Você está o tempo todo no espaço público ali e é muito precário, mas ao mesmo tempo traz uma sensação de liberdade. O trabalhador acha interessante. Mas já era [uma condição de trabalho] muito degradada.”

Trabalho por demanda

Para a socióloga, a uberização não é necessariamente sinônimo de trabalho por plataformas digitais, mas um processo mais amplo e que está em curso há décadas no mundo do trabalho. 

“A questão central da uberização se refere à transformação de nós, trabalhadores, em trabalhadores sob demanda, que já não contam mais com nenhuma garantia sobre quanto tempo precisam trabalhar para ganhar o mínimo necessário para sua sobrevivência, sobre qual o valor da sua hora de trabalho, sobre como o trabalho é distribuído”, disse Abílio.

A socióloga vem pesquisando a uberização como nova organização do mundo do trabalho e mapeou como se dá a precarização nesse modelo: longas jornadas, sem direito a férias, descanso semanal ou licença médica. “A gente pode prever que isso é um processo, que a gente olha pro motoboy hoje e entende, mas que está atravessando o mundo do trabalho como um todo.”

A contratação de pessoas jurídicas, avalia a socióloga, já era um primeiro passo do que viria a ser a definição da uberização. “Já era um símbolo de que ‘olha, tem algo acontecendo aqui que está se criando novas formas de subordinação do trabalhador’”.

“A reforma trabalhista vai modificar o conceito de trabalho formal, então por exemplo, hoje, você tem essa categoria chamada emprego intermitente que é você ser um trabalhador formal, mas viver como um trabalhador sob demanda. Por isso que eu gosto de falar que a uberização não é algo que começou com as plataformas digitais, ela é um processo que está em curso há décadas no mundo do trabalho”, disse.

Oxfam diz que salário de diretores subiu 9%, mas o da base caiu 3,19%


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Em 2022, os diretores executivos (CEOs) mais bem pagos receberam aumentos de 9% em seus salários, ao mesmo tempo que trabalhadores e trabalhadoras viram os valores dos contracheques caírem, em média, 3,19%. Em relatório divulgado hoje (30), a Oxfam (Comitê de Oxford para Alívio da Fome) destaca, ainda, que, no Brasil, a queda dos proventos foi maior, de 6,9%, e que, na outra ponta, acionistas de empresas tiveram um incremento de 23,8% (US$ 27,3 bilhões), de modo que acumularam US$ 33,8 bilhões.

No caso da Suécia, a balança pendeu ainda mais para os privilegiados. Lá, a redução da remuneração da classe trabalhadora foi de 10%. Estados Unidos e Reino Unido igualaram-se, com uma porcentagem de 3,2%, mas têm diferenças quanto aos mais abastados. No caso dos EUA, os 100 principais CEOs ganharam US$ 24 milhões, em média, no ano passado, quantia 15% maior do que a registrada em 2021. No grupo insular, o montante foi de US$ 5 milhões, ficando 4,4% acima do atingido no ano anterior.

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Tais cifras, para efeito de comparação, mostram que um trabalhador dos Estados Unidos teria que se manter em atividade durante 413 anos para conquistar o que o CEO no topo da cadeia recebe em um ano. No que diz respeito ao Reino Unido, o que se nota é que os presidentes de companhias ganham o equivalente a 140 vezes o valor do salário médio dos assalariados.

Dados de referência

A organização não governamental adotou como referência dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para fazer os cálculos. Uma das constatações, que instigam a se pensar no contexto de desigualdades sociais, é o corte médio de US$ 685 na conta de um bilhão de trabalhadores de 50 países, que acabaria significando uma perda coletiva de US$ 746 bilhões em salários reais, caso os salários tivessem sido reajustados pela inflação.

Na África do Sul, a ostentação dos CEOs não foi tanta, mas a disparidade entre o que eles e os trabalhadores da base embolsaram também é expressiva. Os executivos ampliaram em 13% os salários, somando US$ 800 mil, em média, ao fim de 2022, o que correspondeu a 43 vezes o salário médio dos trabalhadores.

Outro dado que ajuda compreender a dinâmica socioeconômica do país africano concerne aos títulos e ações de empresas. O 1% mais rico concentra 95% dos papéis, proporção que cai para 54% nos Estados Unidos.

Outra informação do relatório diz respeito aos dividendos pagos a acionistas, que alcançaram patamar recorde, após alta de 10%. O total foi de US$ 1,56 trilhão, conforme menciona o documento da Oxfam, que também compilou informações sobre a condição das mulheres na base do mercado de trabalho.

A conclusão é de que a jornada mensal de mulheres e meninas tem, pelo menos, 380 bilhões de horas de atividades de cuidado não remuneradas, o que prova que certos estereótipos de gênero, como a função de se responsabilizar, de forma central, pela criação dos filhos, ainda pesam sobre elas. Com frequência, assinala a Oxfam, trabalhadoras acabam encurtando seus expedientes ou mesmo abandonam os empregos por causa dessas atividades. Além disso, também enfrentam discriminação, assédio e recebem salários mais baixos do que os homens.

Salários de mulheres

Um exemplo que ilustra a forma como o mercado de trabalho trata as trabalhadoras é o dos Estados Unidos. Metade das mulheres negras de lá recebe menos de US$ 15 por hora, em troca de sua força de trabalho.

O coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam, Jefferson Nascimento, complementa as colocações da entidade com um dado relacionado ao assunto, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em março deste ano. Segundo o órgão, as trabalhadoras do país recebem um salário 22% menor do que os trabalhadores do gênero masculino.

“Até a pandemia, até 2020, havia uma tendência de diminuição da diferença de remuneração entre homens e mulheres, que foi revertida. Tem vários fatores por trás disso. A maior parte do desemprego é de mulheres, a maior taxa de trabalhadores informais é entre mulheres. A gente sabe que o trabalho informal paga, em média, menos do que o trabalho formalizado. Então, de alguma maneira, a precarização do trabalho, esses instrumentos que a incentivam, como a reforma trabalhista de 2017, criaram as condições para que houvesse esse aumento de diferença”, diz Jefferson.

Uma das direções apontadas pela Oxfam como solução para os problemas elencados no relatório é tributar devida e proporcionalmente a parcela mais rica em todos os países. A ONG lembra, por exemplo, que os impostos sobre a renda de dividendos e ações caíram de 61%, em 1980, para 42% na atualidade, um dado relevante para a discussão, já que é a partir da cobrança desses encargos que se pode ampliar as verbas públicas em áreas como saúde e educação.

Dividendos

O coordenador da Oxfam, observa que, no Brasil, os acionistas receberam, em 2022, cerca de US$ 34 bilhões, que é quase um terço do que todos os países emergentes distribuíram em dividendos no período. E também se aproxima do valor referente ao que trabalhadoras e trabalhadores do país tiveram em cortes de salários.

Para Jefferson, essa margem de lucro entregue aos acionistas deve ser uma das partes que compõem a discussão em torno da reforma tributária, tendo em vista a possibilidade de contrapartida à sociedade que se pode abrir. Ele explica que, no Brasil, a obrigação não se aplica à pessoa física e salienta que a medida já conta com aprovação de ampla parcela da população.

“É um tema que se conecta com esse debate que está se tendo no Brasil, nesse momento, no âmbito da reforma tributária. A gente está debatendo no Congresso Nacional, focando, principalmente agora, no imposto sobre o consumo. Mas, em um segundo momento, e isso tem sido dito no Congresso, se pretende trabalhar com reforma do imposto sobre bens e patrimônio, e é fundamental falar também sobre o retorno da tributação sobre lucros e dividendos”, diz.

 

Lula parabeniza atletas contemplados pelo Bolsa Pódio


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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva parabenizou, neste domingo (30), pelo Twitter, os 339 atletas olímpicos e paralímpicos do país contemplados pelo Bolsa Pódio, categoria mais alta do Bolsa Atleta, programa federal de patrocínio individual, considerado um dos maiores do gênero no mundo. Os esportistas estarão aptos a receber recursos que variam de R$ 5 mil a R$ 15 mil.

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“Parabéns aos contemplados com o Bolsa Pódio! Atletas olímpicos e paralímpicos de elite, qualificados entre os 20 melhores do ranking mundial em suas categorias, que contarão com o apoio, incentivo e torcida do governo federal para representar o Brasil!”, escreveu Lula, em seu perfil oficial.

A lista dos contemplados pela Bolsa Pódio foi divulgada na última sexta-feira (28), sendo eles 207 atletas paralímpicos e 132 olímpicos. Segundo o Ministério do Esporte, a relação pode aumentar, já que o prazo para envio de informações adicionais termina na próxima quinta-feira (4). A atualização, se necessária, sairá com a publicação de uma lista complementar.

Do total de atletas beneficiados, 110 terão direito ao valor máximo do benefício (R$ 15 mil). A modalidade com mais esportistas atendidos é o atletismo paralímpico (56).

Bolsa Atleta

O Bolsa Atleta tem outras quatro divisões: base, estudantil, nacional e internacional. A lista dos contemplados destas categorias foi divulgada no último dia 18 de abril, totalizando 7.868 esportistas atendidos. É a maior relação desde o início dos pagamentos, em 2005, além de ser quase 20% maior que a do edital de 2022. Para 2023, a destinação é de R$ 82 milhões.

Na Olimpíada de Tóquio, no Japão, no ano passado, 80% da delegação brasileira recebiam o Bolsa Atleta. Dos 21 pódios do Brasil naqueles jogos, 19 (90,45%) contaram com esportistas beneficiados. A representatividade do programa na equipe da Paralimpíada – também realizada na capital japonesa – foi ainda maior: 95% dos integrantes, responsáveis por 68 das 72 medalhas obtidas (94,4% do total).

Natação brasileira tem 20 atletas com índice para Mundial paralímpico


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O Brasil tem 20 atletas com índice para o Campeonato Mundial de Natação Paralímpica deste ano, a ser disputado em Manchester, no Reino Unido, entre 31 de julho e 6 de agosto. As marcas foram obtidas durante o Open Internacional, torneio organizado pelo Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) e que terminou no último sábado (29).

No último dos três dias de competição, no Centro de Treinamento Paralímpico, em São Paulo, quatro índices foram alcançados, todos em classes em que os atletas têm deficiências físico-motoras (quanto maior o número da categoria, menor o grau de comprometimento).

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Bruno Becker (classe S2), Edênia Garcia e Maiara Barreto (ambas S3) se credenciaram ao Mundial nos 200 metros (m) nado livre, enquanto Daniel Mendes (S6) atingiu a marca nos 100 m livre.

“É uma sensação indescritível conseguir a marca para o meu segundo mundial. O trabalho está sendo muito bem feito e aproveitado. Agora, vou me preparar com mais tranquilidade e focar nos detalhes, sem a pressão de ainda ter que buscar o índice”, disse Daniel, medalhista de ouro no Mundial do ano passado, em Funchal, em Portugal, no revezamento misto 4×50 m livre 20 pontos (limite da soma das classes dos quatro atletas).

Recorde quebrado

Outro destaque de sábado foi Carol Santiago. A nadadora da classe S12 (baixa visão), que já tinha alcançado índice para o Mundial na quinta-feira (27), primeiro dia de competição, quebrou o recorde das Américas – que já era dela – nos 100 m livre. Na sexta-feira (28), Carol igualou o próprio recorde mundial dos 50 m livre.

A próxima oportunidade para os nadadores brasileiros buscarem índice para o Mundial de Manchester será a 1ª Fase Nacional do Circuito Loterias Caixa, entre os dias 20 e 21 de maio, também no CT Paralímpico. A convocação para a competição no Reino Unido está prevista para ocorrer entre a última semana de maio e o início de junho.

O Brasil teve 29 representantes no Mundial de Funchal, sendo que 26 deles foram ao pódio. O desempenho foi o melhor do país na história do evento, com 53 medalhas (19 douradas) e o terceiro lugar na classificação geral. Todos os nadadores que estiveram em Portugal integravam o Bolsa Atleta, programa de patrocínio individual de atletas, mantido pelo governo brasileiro.

Veja os brasileiros com índice para o Mundial de Manchester

S2: Gabriel Araújo e Bruno Becker

S3: Patrícia Pereira, Edênia Garcia e Maiara Barreto

S5: Samuel Oliveira e Esthefany Rodrigues

S6: Talisson Glock, Laila Suzigan e Daniel Mendes

S8: Cecília Araújo

S9: Mariana Gesteira e Ruan Souza

S10: Phelipe Rodrigues

S12: Carol Santiago e Douglas Matera

S14: Gabriel Bandeira, Débora Carneiro, Beatriz Carneiro e João Pedro Brutos

Rejuste de planos de saúde dependerá de situação de cada operadora


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A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) divulgou, no início da última semana, os dados econômicos financeiros do setor em 2022 e considerou que o ano se encerrou no “zero a zero”. Houve um lucro líquido de R$ 2,5 milhões, resultado bem inferior ao ano anterior. Em 2021, o lucro foi de R$ 3,8 bilhões. Já em 2020, o setor havia registrado um recorde, com o montante de R$ 18,7 bilhões.

O diretor-presidente da ANS, Paulo Rebello, disse à Agência Brasil que a mensagem é de cautela, mas que já há sinais de recuperação. Segundo ele, houve diferenças de desempenho entre as várias operadora de plano de saúde. Os maiores resultados negativos foram registradas por operadoras grandes. Rebello indica que a realidade econômica específica de cada uma delas deverá ter peso na atualização anual dos valores das mensalidades dos seus respectivos planos.

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“Os percentuais de reajustes dependerão da situação de cada operadora”, disse. A ANS é responsável por fixar o índice máximo que pode ser aplicado aos planos de saúde individuais e familiares. No ano passado, o teto foi de 15,5%, maior já aprovado pela agência desde a sua criação em 2000.

Os dados do setor em 2022 estão disponíveis no Painel Contábil da Saúde Suplementar, mantido pela ANS e alimentado com as informações financeiras enviadas pelas operadoras dos planos de saúde. Na segunda-feira (24), foram incluídos os resultados do 4º trimestre de 2022, permitindo assim consolidar os números do desempenho do ano passado.

De acordo com a ANS, a receita efetiva de operações de saúde, principal negócio do setor, foi de R$ 237,6 bilhões. Dessa forma, o lucro de R$ 2,5 milhões representou apenas 0,001% da receita.

“Podemos notar no 4º trimestre uma recuperação. Então é bom esclarecer que o termo ‘zero a zero’ busca apenas evidenciar uma igualdade entre receitas e despesas no setor no exercício de 2022. Houve um resultado positivo irrisório comparado ao total de receitas do ano”, explica Rebello.

Segundo ele, o setor possui recursos para passar por esse período. “Obviamente foi um ano difícil. Houve aumento dos insumos, crescimento na frequência de utilização dos planos. A mensagem é de cautela. Mas já há sinais de melhora”, disse.

A queda do desempenho foi registrada mesmo com o crescimento expressivo do número de beneficiários desde o início da pandemia de covid-19, atingido o recorde de 50,5 milhões no final do ano passado. Um ano antes, em dezembro de 2021, a saúde suplementar registrava 48,9 milhões de beneficiários.

“É importante considerar todo o contexto da pandemia. O setor já esperava um efeito na utilização após o isolamento social. Durante o isolamento social, as pessoas não usavam os planos. Por essa razão, em 2020, houve um lucro histórico”, avalia o diretor-presidente da ANS.

Segmentos

O Painel Contábil da Saúde Suplementar permite fazer recortes dos dados por segmento e por operadora. No caso das operadoras médico-hospitalares, houve prejuízo de R$ 505,7 milhões. Já as operadoras exclusivamente odontológicas, de forma inédita, também tiveram um desempenho negativo. O prejuízo foi de R$ 47,3 milhões.

O único segmento que registrou resultado positivo foi o de administradoras de benefícios. O lucro chegou a R$ 555,57 milhões. Administradoras de benefício são empresas que atuam como intermediárias na contratação de planos de saúde coletivos, como a Qualicorp e a AllCare. Elas conseguem obter junto às operadoras condições diferenciadas para pessoas que tenham vínculo com empresas, órgãos públicos, associações, sindicatos ou conselhos de classe com os quais tenham firmado convênio.

Lula anuncia política de reajuste do salário mínimo e isenção de IR


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O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, anunciou, neste domingo (30), que vai enviar ao Congresso Nacional, nos próximos dias, um projeto de lei (PL) que, se aprovado, tornará obrigatório o reajuste do salário mínimo acima da inflação. Lula também se comprometeu a, até o fim de seu atual mandato, em 2026, aprovar a isenção do pagamento do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais.

“Nos próximos dias, encaminharei ao Congresso Nacional um projeto de lei para que esta conquista seja permanente e o salário mínimo volte a ser reajustado todos os anos acima da inflação”, antecipou Lula ao fazer um pronunciamento em rede nacional de rádio e TV, por ocasião do Dia do Trabalhador, nesta segunda-feira (1º).

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Segundo o presidente, a “valorização do salário mínimo” é parte do projeto de governo, que busca “recompor as conquistas perdidas pelos trabalhadores e trabalhadoras” ao longo dos últimos anos. “A partir de amanhã, o salário mínimo passa a valer R$ 1.320,00 para trabalhadores da ativa, aposentados e pensionistas. É um aumento pequeno, mas real”, reconheceu Lula ao ponderar que, nos últimos seis anos, o reajuste do valor salário mínimo sempre ficou abaixo da inflação acumulada.

Fim do congelamento

Lula também comentou a medida que eleva, a partir de maio, a faixa de isenção do Imposto de Renda cobrado de trabalhadores formais – uma promessa de campanha do presidente. A correção da tabela já tinha sido anunciada pelo ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho.

“Estamos mudando a faixa de isenção do Imposto de Renda, que há oito anos estava congelada em R$ 1.903,98. A partir de agora, até R$ 2.640,00 por mês não pagará mais nenhum centavo de imposto”, pontuou Lula ao classificar esta como “outra medida muito importante”.

“E até o final do meu mandato, a isenção valerá para até R$ 5 mil por mês”, acrescentou Lula, voltando a se comprometer com a elevação gradual da faixa de isenção que, segundo o governo federal, passará a vigorar já a partir de maio por meio da combinação de duas medidas.

Além de, na prática, elevar a faixa de isenção dos atuais R$ 1.903,98 para R$ 2.112, o governo concederá um desconto de R$ 528 sobre o imposto pago na fonte, que é retido automaticamente, todos os meses. A soma dos dois valores totaliza os R$ 2.640,00 anunciados – cifra que equivale a dois salários mínimos de R$ 1.320.

Trabalhadores

“Não haverá reconstrução do Brasil sem a valorização dos trabalhadores e das trabalhadoras. O Brasil vai voltar a crescer com inclusão social e com novos empregos sendo criados. Podem estar certos de que o esforço de seu trabalho vai ser cada vez mais reconhecido e recompensado. E o 1º de Maio, que sempre foi um dia de luta, voltará a ser um dia de conquista para o povo trabalhador”, disse Lula, ao defender a política de valorização do salário mínimo como um “grande instrumento de transformação social”.

“Foi graças a isso que [nos governos petistas, entre 2003 e 2016], milhões de brasileiros e brasileiras saíram da extrema pobreza, abrindo caminho para uma vida melhor. É preciso lembrar que a valorização do salário mínimo não é essencial apenas para quem o ganha. Com mais dinheiro em circulação, as vendas do comércio aumentam. A indústria produz mais. A roda da economia volta a girar e novos empregos são criados.”

Baixada Fluminense tem história de mobilização, afirma ativista


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A data da inauguração da primeira ferrovia do Brasil, a Estrada de Ferro Mauá, marca também o Dia da Baixada Fluminense. O projeto pioneiro está entre os solavancos que tornaram a região uma das mais populosas do Brasil, com quase 4 milhões de habitantes. Por isso, a Lei Estadual 3.822, de maio de 2002, instituiu a data comemorativa em 30 de abril. 

A Baixada é composta por 13 municípios de diferentes tamanhos. Paracambi, Guapimirim e Seropédica têm menos de 100 mil habitantes. Nova Iguaçu, Duque de Caxias e Belford Roxo, mais de 500 mil. Entre esses dois extremos, estão São João de Meriti, Magé, Mesquita, Nilópolis, Queimados, Itaguaí e Japeri.

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Entre as cidades, estão Duque de Caxias, com um dos 20 maiores produtos internos brutos do Brasil, e Japeri, em que a mortalidade infantil chega a 18 a cada mil nascidos vivos, enquanto a média nacional é de 13 a cada mil. 

Negros e evangélicos

O Censo de 2010, o último realizado, caracterizou as cidades da região como mais negras que a média do país, e também com maior população evangélica. Entre os 13 municípios, apenas Nilópolis e Seropédica não têm mais de 60% da população que se reconhecia como preta ou parda naquele censo. Esse percentual chega a 70% em Japeri, e a quase 68% em Belford Roxo. Em Seropédica, o número de evangélicos supera o de católicos em mais de 50%, e os protestantes também são mais numerosos nas duas maiores cidades da região, Nova Iguaçu e Duque de Caxias.

Militante pelos direitos humanos, cientista social e coordenador executivo da organização não governamental Fórum Grita Baixada, Adriano de Araújo critica, em entrevista à Agência Brasil, a generalização com que a região costuma ser tratada, e a falta de visibilidade de iniciativas culturais e sociais promovidas por moradores da região. Sua esperança em relação ao futuro da região vem do passado de grande mobilização do povo da Baixada Fluminense.

“Aqui, tem uma série de riquezas históricas. A Baixada tem muita capacidade de se mobilizar, gritar e buscar os seus direitos. Infelizmente, a gente não é acompanhado pelos governantes”, diz.

O fórum preparou um minidocumentário em que ouviu depoimentos de moradores dos 13 municípios sobre o que consideram positivo e negativo na região, além de perguntar o que significa ser um morador da Baixada Fluminense.

Entrevista

Agência Brasil: Vocês ouviram moradores de toda a Baixada sobre o que significa ser morador da região. Dá para tirar uma média e dizer uma resposta que sintetize o que vocês ouviram?

Adriano de Araújo: Eles apontaram de uma forma positiva o fato de se sentirem felizes no território muito em função da população, do jeito de ser das pessoas, da acolhida. É uma região que acolhe diferenças culturais, pessoas vindas de outros estados. Que acolhe a cultura de outros povos. Foi um aspecto que se sobressaiu. O que apareceu de positivo também foi a tranquilidade do local, nas cidades com uma população menor, e o comércio e a pluralidade cultural, nas cidades maiores.  

Agência Brasil: O fórum foi criado para reivindicar direitos humanos para os moradores da Baixada. Quais são as violações mais frequentes no caso particular dos moradores da Baixada?

Adriano de Araújo: A violência é, infelizmente, um processo marcante da região. A gente tem índices de violência letal que são proporcionalmente maiores que na capital. Então, isso, de fato, atinge uma parcela significativa da população, principalmente a população pobre, preta e das periferias. A população em geral pode ter um sentimento generalizado de insegurança, mas, as chacinas, por exemplo, não acontecem em todos os lugares. Existem lugares específicos onde essas chacinas ocorrem, bairros mais pobres e mais negros. Outros problemas atingem a grande maioria da população, como a má qualidade dos transportes, as condições precárias de funcionamento tanto dos ônibus quanto do trem. E o saneamento básico, que é um problema vital aqui na Baixada Fluminense, pela própria condição geográfica, de ter várias áreas pantanosas e alagadiças. Tem também a falta de equipamentos públicos de cultura e lazer. Há cidades que não têm uma sala de cinema. Outros aspectos que marcam muito o cotidiano da Baixada Fluminense são os feminicídios, os ataques a religiões de matriz africana e a LGBTfobia, que infelizmente ainda são muito presentes. 

Agência Brasil: A violência é um tema recorrente no noticiário sobre a região, e, de fato, é um problema real dos moradores. Mas isso, de alguma forma, tem contado uma história única sobre a região? A Baixada está sendo reduzida a isso?

Adriano de Araújo: Isso é um aspecto extremamente importante, em que a gente procura não perder a dimensão crítica, mas, ao mesmo tempo, também não cair no absolutismo das informações e, principalmente, nos estereótipos. A violência é um fenômeno presente na dinâmica não só da Baixada Fluminense, mas nas periferias do Rio de Janeiro, em regiões empobrecidas e negras. Agora, a gente percebe muito, quando faz uma avaliação da linguagem jornalística, que, quando algo acontece na cidade do Rio de Janeiro, se cita o bairro e até a rua, mas, quando se trata da Baixada, há uma generalização tão grande que, às vezes, nem as cidades são mencionadas. “Ocorreu uma chacina na Baixada Fluminense”. Ou, “em Nova Iguaçu”, que tem quase um milhão de pessoas e uma extensão muito grande. E a gente não vê os movimentos sociais que lutam contra a violência tendo destaque. Existe uma série de organizações que procuram trabalhar a educação, a cultura, o protagonismo da juventude, o enfrentamento do racismo, e que muitas vezes não têm espaço na mídia. A mídia tem uma facilidade muito grande de noticiar as milícias, as chacinas e a violência política, e isso precisa, sim, ser mostrado, mas a forma, muitas vezes, passa por um estereótipo e sem informações que permitam às pessoas ter uma visão mais crítica do que está acontecendo. 

Agência Brasil: Como você disse, é muito comum que se fale de Baixada Fluminense como um conjunto, mas sabemos que suas cidades são muito distintas. O que você acredita que une essas cidades, além da geografia, e quantas Baixadas você acredita que existem dentro da Baixada?

Adriano de Araújo: Se fala da Baixada como se fosse um bairro ou uma cidade, mas é uma região de 13 cidades, com quase quatro milhões de pessoas e cidades muito diferentes entre si. Você tem cidades como Guapimirim, por exemplo, com regiões com Mata Atlântica e vegetação preservadas, e outras cidades industriais, com uma diversidade cultural e populacional muito grande. Tem uma Baixada que tem mais um ar de uma cidade do interior, com pessoas que nasceram e vivem até hoje no local e que tem um amor muito grande pela forma como vivem, mais tranquila e mais calma, e tem cidades maiores, como Duque de Caxias, Nilópolis, Nova Iguaçu, Belford Roxo e São João de Meriti, que sofrem todos os processos muito típicos das grandes periferias dos centros urbanos. A grosso modo, se fossemos resumir de forma mais bruta, teríamos essas duas grandes Baixadas. Essa Baixada mais urbana, com os problemas e qualidades urbanas, e a Baixada interiorana, familiar e pacata, com uma população que se conhece melhor e não vê uma mudança tão bruta ao longo do tempo, com uma natureza mais preservada.

Agência Brasil: A Baixada tem um dos municípios que mais produz riquezas no Brasil, que é Duque de Caxias, e algumas localidades marcadas pela pobreza extrema, como Japeri. Como você vê essa disparidade?

Adriano de Araújo: Eu acho que é espelho do que acontece no Brasil. Quando a gente fala dessa riqueza, a gente está falando muito em função do desenvolvimento da indústria petroquímica de Duque de Caxias, que foi vital para o seu desenvolvimento. Mas essas não são riquezas que, de fato, são distribuídas para o conjunto da população. As elites políticas têm uma relação de exploração da Baixada Fluminense. Muitas lideranças políticas locais, depois que se tornam prefeitos, saem da cidade delas e vão para o Rio de Janeiro. Então, fica essa perspectiva de curral eleitoral, de ter um espaço onde você se projeta politicamente e, em função disso, você passa a ganhar privilégios e benefícios. Isso faz com que muitos governos não pensem em políticas públicas de enfrentamento dessas desigualdades. E são essas desigualdades que vão se reproduzir em baixa qualidade dos empregos, dos salários, das condições de vida e habitação. O que acontece na Baixada acontece também em outras cidades e na própria cidade do Rio de Janeiro. Muito do que se vende do Rio de Janeiro está na zona sul, mas a zona norte e a zona oeste, com algumas exceções, são muito próximas da Baixada Fluminense nesse sentido. São mais próximas da Baixada do que da zona sul.

Agência Brasil: A Baixada é terra de muitos terreiros de umbanda e candomblé, de escolas de samba fortes no carnaval do Rio e também é uma das regiões mais negras do Brasil. O resgate dessa autoestima da Baixada passa também pela valorização da sua ancestralidade?

Adriano de Araújo: Temos muitos grupos culturais, pessoas produzindo cinema aqui na Baixada Fluminense. O hip hop é muito forte na Baixada. Teve um movimento também de reggae bem interessante em Belford Roxo. Então, tem uma diversidade cultural que nem nós mesmos do Fórum Grita Baixada conhecemos todo, tamanha é essa diversidade. As religiões de matriz africana têm um papel importantíssimo na história da Baixada, e várias cidades têm buscado valorizar a cultura africana, a cultura negra. Existe uma série de movimentos, os assentamentos dos povos nativos, dos povos ancestrais, e é preciso trazer visibilidade para essas manifestações todas. 

Agência Brasil: O que te causa esperança e o que te causa preocupação a respeito do futuro da Baixada?

Adriano de Araújo: A esperança é o povo da Baixada. É esse povo que luta, esse povo que acredita, se articula. Uma das coisas que mais me marcam e trazem orgulho é a história de mobilização da Baixada Fluminense. Eu não me canso de dizer que a Baixada Fluminense, em alguns momentos da história do país, foi protagonista de muitos movimentos. Semana passada, foi lançado um filme em homenagem a Nair Jane, que é uma liderança aqui da Baixada Fluminense, que criou o Sindicato das Trabalhadoras Domésticas. Lá estava Benedita da Silva [deputada do PT-RJ] falando da importância da Nair Jane para o movimento nacional das trabalhadoras domésticas. Aqui, tem também o trabalho que a Pastoral da Terra fazia em relação à questão do direito à terra. Antes de existir o MST, já existia movimento de ocupação de terras aqui na Baixada Fluminense. Aqui também já se denunciava os esquadrões da morte e os grupos de extermínio antes de se falar sobre milícias, de se escrever sobre milícias. O movimento de mães, o movimento feminista. Aqui tem uma série de riquezas históricas. A Baixada tem muita capacidade de se mobilizar, gritar e buscar os seus direitos. Infelizmente, a gente não é acompanhado pelos governantes, e talvez essa seja a minha grande preocupação, a política na Baixada. São governos e governos que se sucedem com acusações de corrupção e envolvimento com o crime. Há vários casos de prefeitos denunciados por associação criminosa, muitos vereadores ligados a grupos milicianos. Isso é fonte de preocupação. É a ilegalidade tomando posse dos instrumentos de estado, da legalidade. E o que imaginar que vai ocorrer em cidades em que grupos criminosos tomam o poder? Isso me preocupa, porque vai repercutir em problemas na educação, na saúde e, com certeza, na segurança. Mas entendo que é algo que está dentro de um contexto político de todo o país.

PF ouve primeiros depoimentos sobre ataque na Terra Yanomami


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Agentes da Polícia Federal (PF) estiveram neste domingo (30) na Terra Indígena Yanomami para apurar o ataque à comunidade indígena Uxiú. Segundo lideranças indígenas, três yanomamis foram baleados na tarde deste sábado (29). Uma das vítimas, um agente de saúde que atuava na comunidade, morreu no local. As outras duas vítimas foram socorridas no posto de saúde que funciona na própria reserva e, posteriormente, transferidas para o Hospital Geral de Roraima, onde estão internadas.

Em nota divulgada esta tarde, a Superintendência da PF em Roraima informa que tomou conhecimento no início da noite de ontem que garimpeiros teriam atacado a comunidade indígena. Já na madrugada de hoje, duas equipes do órgão foram deslocados para o local, com o apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e da Aeronáutica. O objetivo, segundo a PF, era não só começar a investigar o que aconteceu, como também “interromper eventuais agressões que ainda estivessem em andamento”.

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Ainda segundo a PF, os agentes periciaram o local e ouviram o depoimento preliminar de testemunhas. “Outras diligências seguem em andamento para identificar, localizar e prender os autores dos crimes cometidos contra os indígenas”, garante o órgão, na nota em que menciona que os invasores da terra yanomami e os indígenas chegaram a trocar tiros.

Nas mídias sociais, o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) Yanomami, Júnior Hekurari, denunciou que a comunidade Uxiú foi atacada por garimpeiros armados que “alvejaram” os três indígenas.

A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, também usou suas contas nas redes sociais para anunciar que uma comitiva interministerial vai a Roraima para “reforçar ainda mais as ações de desintrusão [retirada de não-indígenas] dos criminosos” da área yanomami que, segundo ela, foram atacados a tiros. “Solicitamos reforço do Ministério da Justiça para investigação da PF sobre este caso”.

Paraguaios escolhem futuros presidente e governadores

Quase 4,8 milhões de eleitores estavam aptos a participar, neste domingo (30), da escolha dos futuros presidente e vice-presidente do Paraguai, além de 17 governadores, deputados e senadores. Desde as primeiras horas da manhã, enormes filas se formaram na maioria dos 1.157 locais de votação distribuídos pelo país. Na capital, Assunção, houve quem esperasse até três horas para votar, conforme noticiaram veículos de imprensa paraguaios, como o ABC Color.

A lentidão no processo obrigou a Justiça Eleitoral, já no início da tarde, a fazer um pronunciamento para tranquilizar os eleitores, garantindo que todos que chegarem aos locais de votação até o fechamento dos portões, às 17h (horário de Brasília), poderiam votar. Durante coletiva de imprensa, membros da Comissão Especial Eleitoral descartaram que a demora e as consequentes filas tenham sido causadas por problemas nas urnas eletrônicas, destacando que o pleito motivou uma grande participação popular.

Mais cedo, o comandante da polícia, Gilberto Fleitas, já tinha declarado que, apesar das filas e das reclamações, a votação transcorre normalmente.

Treze chapas (formadas por candidatos a presidente e a vice-presidente) disputam a sucessão do atual chefe do Poder Executivo nacional, Mario Abdo Benítez, e o direito de chefiar o país pelos próximos cinco anos. As mais recentes pesquisas eleitorais apontavam como favoritos na disputa os conservadores Santiago “Santi” Peña e Pedro Alliana, do mesmo partido de Benítez, o Colorado, e Efraín Alegre e Sole Núñez, do bloco de centro-esquerda Concertação Nacional por um Novo Paraguai. Ao contrário do Brasil, a eleição, no Paraguai, é encerrada em um único turno.

Além de definir quem serão os próximos presidente e vice-presidente paraguaios e 17 governadores, os eleitores também estão escolhendo 45 senadores titulares e 30 suplentes; 80 deputados titulares e 80 suplentes, além de 257 membros titulares e 257 suplentes para as chamadas Juntas Departamentais, equivalentes às assembleias legislativas estaduais existentes no Brasil.

Entre os 4.782.940 milhões de eleitores aptos a votar, 41.505 estão inscritos a votar em outros países onde foram instaladas urnas em embaixadas e consulados, incluindo o Brasil, Argentina, Espanha e Estados Unidos.