Rio Grande do Sul pode ter alto volume de chuva nos próximos dias


Logo Agência Brasil

Boletim meteorológico divulgado pela Sala de Situação do governo do Rio Grande do Sul adverte sobre alto volume de chuva e temporais nos próximos dias, sobretudo na metade sul do estado. Até o momento, 46 mortes foram confirmadas em decorrência dos temporais e do ciclone extratropical que atingiram a região.

Em meio a toda essa situação, o governo federal garantiu um total de R$ 741 milhões em recursos para os municípios gaúchos afetados.

Previsões meteorológicas

Notícias relacionadas:

“Entre segunda (11) e sexta-feira (15), há risco de tempo severo em áreas do estado. Os volumes de chuva podem variar entre 100 milímetros e 200 milímetros nas regiões sul, de campanha, oeste, centro, sudeste, leste e noroeste e ultrapassar 250 milímetros em alguns pontos. Além disso, o risco é alto para queda de granizo, descargas elétricas e vento forte”, informa o boletim.

O risco de “tempo severo”, esperado até esta terça-feira (12) na metade sul do estado, deverá se espalhar pela maioria das regiões já na quarta-feira (13), em especial nos Vales e no leste, além de se manter na metade sul.

Na quinta-feira (14), a expectativa é de “chuva moderada a forte com vento, sobretudo na metade sul e nas regiões dos Vales, noroeste, norte, leste e nordeste”, acrescenta o boletim meteorológico divulgado pela Sala de Situação. “Não são descartados transtornos associados aos temporais isolados e aos elevados acumulados”.

Recursos federais

Os R$ 741 milhões em recursos federais anunciados nesse domingo (10) terão como origem diferentes pastas ministeriais e órgãos federais e serão utilizados em ações de busca e salvamento, assistência humanitária e atendimento à população afetada, restabelecimento de serviços essenciais e reconstrução de moradias, estradas e de um hospital, informou o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR).

Deste total, R$ 185 milhões serão do próprio MIDR, para reconstrução de infraestruturas danificadas, como pontes e rodovias – bem como para viabilizar o restabelecimento de serviços essenciais e prestar assistência humanitária à população atingida.

Os primeiros repasses foram para os municípios de Roca Sales (R$ 2,36 milhões); Encantado (R$ 1,2 milhão); Muçum (R$ 1,12 milhão); Três Cachoeiras (R$ 309,8 mil); Cruzeiro do Sul (R$ 651,2 mil); Estrela (R$ 309 mil); Imigrante (R$ 173,32 mil); Maquiné (R$ 94,8 mil); Nova Bassano (R$ 91,9 mil)  e Passa Sete (R$ 73,2 mil).

Equipes da Defesa Civil Nacional apoiam, desde o dia 4, prefeituras das cidades atingidas para a elaboração dos pedidos de repasse de recursos. Além disso, integrantes do Grupo de Apoio a Desastre (Gade) têm se reunido com 32 representantes de 12 cidades da região do Alto Taquari, para orientar sobre procedimentos.

A solicitação dos recursos deve ser feita por meio do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2iD), informa o ministério.

Mutirão oferece 1,7 mil vagas de estágio para LGBTQIA+ no Rio


Logo Agência Brasil

Um mutirão vai oferecer nesta terça-feira (12) 1,7 mil vagas de estágio para universitários LGBTQIA+ na Estação Carioca/Centro do MetrôRio. A ação é uma parceria entre a concessionária e o Centro de Integração Empresa–Escola do Rio Janeiro (CIEE Rio) e vai receber inscrições entre 7h e 18h.

Poderão se candidatar universitários de qualquer área, a partir do segundo período da faculdade. Os profissionais do CIEE receberão os interessados no mezanino próximo ao Acesso B (Avenida Chile) da estação.

Notícias relacionadas:

Os inscritos no processo seletivo serão avaliados nos quesitos capacidade técnica, analítica e habilidades comportamentais. A ação faz parte do programa O CIEE em Movimento, que tem outras ações inclusivas previstas até o fim do ano em parceria com o MetrôRio.

O CEO do CIEE Rio, Luiz Gustavo Coppola, destaca que a população LGBTQIA+ ainda enfrenta muita discriminação no mercado de trabalho, e a iniciativa busca dar visibilidade a talentos que são excluídos durante os processos seletivos.

Preconceito frequente

Uma pesquisa realizada pela rede social LinkedIn no ano passado mostrou que 40% das pessoas da comunidade que foram entrevistadas já haviam sido discriminadas no ambiente de trabalho. Entre os heterossexuais ouvidos pela pesquisa, metade disse já ter presenciado situações de discriminação contra LGBTQIA+.

A população LGBTQIA+ inclui pessoas de orientações sexuais e identidades de gênero diferentes da normatividade heterossexual e cisgênero. Fazem parte da sigla lésbicias, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queer, intersexuais e assexuais.

Ainda não há uma contagem populacional no país de quantas pessoas fazem parte do grupo, que foi novamente excluído do Censo 2022. A última Pesquisa Nacional de Saúde do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizada em 2019, indicou que há ao menos 2,9 milhões de brasileiros que se identificam com sexualidades diferentes da heterossexualidade.

O instituto considerou na época que o número podia estar subestimado e esclareceu que a pesquisa não incluiu perguntas sobre identidade de gênero, o que também poderia permitir a contagem de transexuais.

Governo libera mais de R$ 95 milhões para educação nos municípios


Logo Agência Brasil

O Ministério da Educação publicou, nesta segunda-feira (11), uma portaria no Diário Oficial que libera R$ 95.226.251,05 para novas matrículas em turmas de educação infantil, em 221 municípios. O recurso do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) é destinado às creches e escolas públicas, ou instituições sem fins lucrativos conveniadas com o poder público.

Segundo o Censo Escolar 2022, existem 74,4 mil creches, em todo o país, das quais 66,4% são da rede pública e 33,6%, da rede privada. Dessas, mais da metade, possuem convênio com a rede pública de educação infantil.

Notícias relacionadas:

De acordo com a Secretaria de Educação Básica, os recursos viabilizarão 19.756 novas vagas, sendo 6.727 em creches de período parcial e 4.431 em creches de período integral. Outras 7.447 vagas serão destinadas a vagas pré-escolares em período parcial e 1.151, em período integral.

Os municípios beneficiados são os que realizaram o cadastro das novas vagas conforme prevê a Lei 12.722/2012, que estabelece as regras para o apoio financeiro da União com o objetivo de ampliar a oferta de educação infantil. Receberão recursos municípios nos estados do Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe e São Paulo.

Os valores descritos no documento serão repassados às secretarias municipais diretamente na conta-corrente cadastrada no Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle (Sismec). E, até 30 de junho de 2024, os municípios terão que apresentar a prestação de contas ao Conselho do Fundeb, por meio do Sistema de Gestão de Prestação de Contas (SiGPC).

Estudo da PUC-PR mapeia violências contra pessoas em situação de rua


Logo Agência Brasil

Um estudo desenvolvido na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) analisou casos envolvendo violência contra pessoas em situação de rua. Foram mapeados episódios ocorridos na Região Metropolitana de Curitiba, entre maio e novembro do ano passado. A maioria das ocorrências envolveu violência física.

O levantamento foi feito com base em denúncias coletadas pelo Observatório Estadual de Direitos Humanos da População em Situação de Rua do Paraná, criado em 2021 através da articulação de entidades sociais, grupos acadêmicos e os conselhos profissionais de Psicologia e Serviço Social. No período analisado, ocorreram 30 casos. Cada um deles poderia envolver simultaneamente denúncias de diferentes formas de violência.

Notícias relacionadas:

A análise dos dados foi realizada na dissertação de mestrado de Isabele Cristine Gulisz. Ela pondera: “destaca-se que esses números não condizem com a totalidade das ocorrências, considerando os inúmeros casos de violações de direitos que ocorrem diariamente contra essa população, os quais, infelizmente, não chegam em sua maioria ao conhecimento do Observatório”.

O professor da PUC-PR, Rodrigo Alvarenga, que orientou a pesquisa, chama atenção para o perfil mais recorrente dos denunciantes.

“A gente percebeu que a maior parte são pessoas que estavam na rua entre seis meses e um ano. Pelo empobrecimento, acabaram nessa situação e estão mais propensas também a denunciar. Porque, muitas vezes, uma pessoa que já está há 10 ou 20 anos em situação de rua nem acredita mais na denúncia. Já desistiu de procurar os seus direitos.”

A violência física foi a mais denunciada, representando 22% do total. Em seguida, aparecem as denúncias de discriminação (18%), de violência psicológica (18%), de negligência (17%), e de violência institucional (15%). Outras categorias somaram 10%. Dentro de violência institucional, foram consideradas denúncias envolvendo abuso policial, abuso de autoridade, higienismo, retirada de pertences, descaso de atendimento, remoção forçada e superlotação de abrigos.

“Tem certas violências relacionadas aos equipamentos públicos que a gente considera ser resultado da discriminação, da negligência e da violência institucional. Nos espaços de acolhimento sempre tem denúncia de muquirana e percevejo. As pessoas ficam todas picadas por insetos. Os responsáveis por esses espaços falam que a dedetização está em dia, mas há um problema meio generalizado que leva as pessoas, mesmo numa cidade fria como Curitiba, a não aceitar ir para uma unidade de acolhimento nem no inverno”, exemplifica Alvarenga.

Foram constatados ainda que cinco casos envolveram mortes de pessoas em situação de rua. Em três deles, as causas não foram identificadas. Um envolveu um crime de homicídio, mas o estudo não obteve informações do agressor. O outro caso, a suspeita é de hipotermia. Segundo a denúncia que chegou ao Observatório Estadual de Direitos Humanos da População em Situação de Rua do Paraná, a vítima teve os seus pertences tomados pela Guarda Municipal dois dias antes.

“Na noite do óbito os termômetros apontavam para 6ºC e a vítima foi supostamente encontrada em posição fetal, tentando manter a temperatura do corpo”, registra o estudo.

A atuação da Guarda Municipal também é citada em análise feita sob um ângulo racial. Ela aparece como a principal autora de violações contra homens pretos em situação de rua. Considerando todos os 30 casos mapeados, 47% das vítimas foram pessoas pardas, 41% pretas e 12% brancas.

“Me parece que o mais importante, para nós enquanto grupo de pesquisa, é perceber que as violações de direitos humanos que ocorrem de forma sistemática não são exatamente abusos de um guarda municipal ou um policial em particular. São abusos que ocorrem em função do tipo de operação designada pelo poder público com relação à população em situação de rua. Então os servidores públicos ou os próprios guardas são empurrados para fazer uma tarefa que é higienista. Acabam sendo designados para remover pessoas e essa questão da remoção forçada é um dos principais problemas, porque é uma violação de direitos”, diz Rodrigo Alvarenga.

Segundo ele, as violações são praticadas muitas vezes com a participação de responsáveis pela assistência social. Ele diz que, não apenas na região metropolitana de Curitiba como em diversas cidades do Brasil, há relatos de iniciativas higienistas conduzidas por quem deveria zelar pelos direitos dessa população.

“São operações que seriam de abordagem social e limpeza da cidade, mas na prática se trata de remover as pessoas em situação de rua de locais que são públicos e dos cartões-postais da cidade”, lamenta Alvarenga.

Exclusão

Em sua dissertação, Isabele observa que direitos fundamentais e humanos da população em situação de rua são constantemente negados e violados, mantendo-os excluídos e marginalizados pela sociedade em geral. Essas pessoas também são usualmente tachadas como indivíduos criminosos, vagabundos e perigosos. No entanto, são elas que se veem constantemente em situação de perigo, risco e vulnerabilidade, estando sujeitas a diferentes formas de violência: física, sexual, psicológica, patrimonial, institucional, etc.

Isabele também chama a atenção que o problema dessas pessoas que chegam à situação de rua é multifacetado, pois elas concentram simultaneamente vulnerabilidades sociais, psicológicas, físicas, emocionais e econômicas. No entanto, são frequentemente responsabilizadas por sua condição, a partir de discursos que as culpabilizam.

Geralmente enfrentam a falta de possibilidades reais de oferta de recursos e políticas públicas que auxiliem no processo de superação da situação de rua. A pesquisadora também observa que a violência contra as pessoas em situação de rua é naturalizada pela sociedade.

“Compreender as formas de violência que afetam a população em situação de rua contribui não somente para dimensionar o problema e pensar em possíveis soluções pontuais e individuais, mas também auxilia na criação de espaços de discussão sobre a cidade, os direitos, as desigualdades, a justiça e a própria sociedade.”

Retrato Nacional

Para analisar a situação de forma mais aprofundada, o estudo também reuniu dados de outros levantamentos. Segundo uma pesquisa realizada em 2018 na Universidade Federal do Pará (UFPA), o Centro Nacional de Defesa de Direitos Humanos da População em Situação de Rua e Catadores de Material Reciclável (CNDDH) registrou entre 2010 e 2014 cerca de 2,5 mil denúncias recebidas em todo o país envolvendo violações de direitos, como agressões, assassinatos, abuso de autoridade e de instituições.

Também neste mapeamento, a violência física apareceu como a mais denunciada, representando 34,4% do total, seguida da violência institucional, em 24,1%. A negligência apareceu em 16,3% das denúncias e a violência psicológica em 16,1%. Foi registrado ainda um total de 327 casos de homicídios de pessoas em situação de rua em 2013 e 248 casos em 2014.

Dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinam), gerido pelo Ministério da Saúde, reforçam esse quadro. Ele mostra que, entre 2015 e 2017, foram registrados no país 17.386 atendimentos de casos de violência motivada em razão da condição de situação de rua da vítima.

Em relação às formas de violência, a de maior predominância nos registros foi a física, com 92,9%. Posteriormente aparecem a violência psicológica e moral com 23,2% e a violência sexual com 3,9%. Sobre os autores da violência, desconhecidos foram os principais acusados, com 34,9%, seguido de amigos ou conhecidos, com 31,5% dos casos. No recorte racial, pessoas negras foram alvos mais frequentes, com 54,8%.

Covid-19

A população em situação de rua cresceu na última década em um ritmo muito superior ao crescimento vegetativo da população brasileira. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), saiu de 90.480 em 2012 para 281.472 em 2022. Um aumento de 211%. Considerando apenas os três últimos anos dessa série, entre 2020 e 2022, houve um salto de quase 67 mil novas pessoas em situação de rua.

Este último período engloba a crise sanitária decorrente da disseminação mundial da covid-19. No ano passado, como parte do desenvolvimento do estudo, Rodrigo Alvarenga e Isabele Cristine Gulisz publicaram em conjunto um artigo científico chamando atenção para violações de direitos durante a pandemia. Eles observaram que o isolamento social e as medidas de segurança adotadas para proteger a população não foram acompanhadas de ações que minimizassem os impactos sofridos pelas pessoas em situação de rua.

O artigo analisa em destaque o contexto de Curitiba, onde o caso foi parar na Justiça. Uma ação foi movida pela Defensoria Pública do Paraná para exigir que o município garantisse direitos básicos durante a pandemia, tais como acesso a serviços públicos e vagas suficientes em unidades de acolhimento.

“Sem água e banheiros públicos para realização de sua higiene pessoal e hidratação, com restaurantes populares e comércios fechados, sem itens de segurança como máscaras, luvas ou álcool gel, a vida de quem se encontra em situação de rua tornou-se rapidamente sacrificável. Expostos à contaminação, sede, fome e abandono do poder público, a vulnerabilidade em face da repressão e violência policial se intensificaram”, escreveram.

Assassinato de Ana Lídia completa 50 anos de silêncios e impunidade


Logo Agência Brasil

Uma dor intraduzível. Um trauma brasileiro imensurável. O silêncio e o medo típicos de um momento de ditadura. “Eu nunca vi um silêncio como aquele. Era um silêncio sepulcral. As pessoas não precisavam falar. Elas só olhavam e cada uma sabia o que a outra estava pensando e sentindo”, lembra a professora universitária Rosângela Vieira Rocha, hoje, aos 70 anos de idade, em entrevista à Agência Brasil. Ela era amiga da família de Ana Lídia Braga, menina de apenas 7 anos de idade, que foi capturada, torturada e morta (e ainda depois violentada sexualmente), em Brasília, naquele 11 de setembro de 1973.

Brasília (DF) 10/09/2023 - Especial Ana Lídia 50 anos, a ex professora de Ana Lídia, Rosângela Vieira Rocha posa para fotografia em sua resodência.
Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Rosângela Vieira Rocha frequentava a casa da família. Foto: Joédson Alves/Agência Brasil. 

Cinquenta anos depois, a crueldade se torna ainda mais inacreditável diante da impunidade e da investigação falha. Segundo o processo guardado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no dia 11, por volta de 13h50, a menina, que era filha caçula dos servidores públicos Álvaro Braga e Eloyza Rossi Braga, desapareceu na porta de um colégio particular (Madre Carmen Salles) na Asa Norte, em Brasília. O processo, que tramitou na 7ª Vara Criminal e no Tribunal do Júri de Brasília, aponta que testemunhas viram que um homem loiro e alto levou a menina da escola naquela tarde.  

Notícias relacionadas:

Confira o processo na íntegra disponibilizado pelo TJDF.

O mundo desabou quando a empregada da família foi buscá-la e recebeu a informação que a menina não esteve nas aulas naquele dia. Ainda de acordo com o processo, a família chegou a receber dois telefonemas com pedido de resgate. No dia seguinte, o corpo da criança morta foi encontrado em uma valeta, nua, coberta por terra, os cabelos cortados e sinais de violência física e sexual. A estimativa dos peritos é que Ana Lídia tenha sido assassinada às 6h da manhã do dia 12.

Na ocasião, o inquérito policial apontou que um funcionário público, Raimundo Lacerda Duque (que trabalhava com a mãe da menina), de 30 anos, e o irmão de Ana Lídia, o estudante Álvaro Henrique Braga, de 18 anos, foram os responsáveis pelo crime.

Duque era subordinado à mãe de Ana Lídia no Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp). Segundo o processo, o rapaz era usuário de drogas. Ele fugiu depois que as investigações indicavam a participação dele no crime. Eles chegaram a ser presos, mas foram absolvidos, em 1974, por “falta de provas”. Duque morreu de alcoolismo em 2005 . O irmão da menina, Álvaro, é médico angiologista no Rio de Janeiro. Por telefone, ele disse à Agência Brasil que não gostaria de falar sobre o caso. 

A então estudante de jornalismo Rosângela Vieira Rocha era amiga de escola de Cristina Elizabeth Braga, que tinha 20 anos, irmã mais velha da menina Ana Lídia. Rosângela frequentava a casa da família. “Eu lembro da voz da Ana Lídia. Ela sempre conversava com a gente. A menina era cercada de muito carinho por parte da irmã e de todos. O tempo não tirou da gente essas lembranças fortes”, disse, emocionada, em entrevista à Agência Brasil

Depois da morte da menina, Rosângela nunca mais viu Cristina (que era estudante de sociologia) ou a família dela. “Lembro que eram todos muito carinhosos com a menina também em função da diferença de idade. Ana Lídia tinha uma voz fininha, era muito engraçada e não tinha timidez. Loirinha com os olhos azuis, que viviam com as revistinhas do Pateta”.

Rosângela recorda que a família tinha um piano na sala de casa com a foto da mãe grávida de Ana Lídia. Outra lembrança é que Duque, acusado pelo Ministério Público pelo assassinato, antes havia passado a conviver com a família a partir do apoio que Eloyza resolveu prestar ao funcionário, que era usuário de drogas. Quando chegou a notícia do desaparecimento e da morte, conforme Rosângela recorda, houve um grande desespero da família. 

Uma vizinha da família na Asa Norte, Lunamar Queiroz, que atualmente trabalha como artesã, recorda de um momento marcante, sobre quando o irmão soube pela polícia que a irmã estava morta. “Nós escutamos o grito dele imediatamente. Eu escuto até hoje aquele grito de horror”.

Cerceamento

A tristeza, naqueles dias, não podia ser expressada de forma mais enfática, segundo Rosângela Vieira, porque havia medo. Havia receio de realização de protestos, mas a cidade estava atônita. “Olhávamos uns para os outros e chorávamos. Mas a imprensa noticiou o fato com superficialidade. Como estudante de jornalismo, sabíamos que a profissão era cerceada. Era tudo muito difícil.” 

O Brasil vivia a ditadura do governo de Emílio Garrastazu Médici.  A mesma certeza do cerceamento tem o jornalista e pesquisador Roberto Seabra. Ele escreveu o livro Silêncio na Cidade, uma obra de ficção totalmente inspirada no que pesquisou sobre o crime.

Brasília (DF) 10/09/2023 - Especial Ana Lídia 50 anos - Roberto Seabra. Foto: Arquivo Pessoal/Divulgação

Roberto Seabra investigou o tema por cinco anos – Arquivo pessoal/Divulgação

Para escrever, ele trocou os nomes das personagens em vista de não haver respostas oficiais, nem de familiares, que também silenciaram a respeito do episódio. Assim, no livro, o nome Ana Lídia foi trocado por Ana Clara, por exemplo. O pai do jornalista, inclusive, era policial na ocasião do crime e dizia ao filho que não faltavam provas, mas sim vontade de concluir o inquérito.

Uma versão do livro de Seabra voltada para adolescentes será lançada no final de setembro.

Silêncio

“Meu pai falava que havia um caminhão de provas e que não investigavam porque não queriam. A investigação foi interrompida e a imprensa foi proibida de falar sobre o tema. Por que proibir a cobertura do assassinato de uma criança de sete anos?” Ele atribui a situação ao fato do país viver uma ditadura militar e estranhamente haver ordens para um silenciamento. 

O caso ganhou mais mistério quando a imprensa passou a divulgar um suposto envolvimento do filho do então ministro da Justiça, Alfredo Buzaid Júnior, e do filho do senador Eduardo Rezende, Eduardo Eurico Rezende. A partir dessas repercussões, como explicam pesquisadores do caso, a censura mostrou sua mão mais forte.

A pesquisa é complexa porque, em 1974, o Departamento de Polícia Federal encaminhou aos veículos de comunicação uma “ordem superior” que tornava proibida a divulgação do caso Ana Lídia.

Seabra investigou o tema durante cinco anos e utilizou até a documentação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), do ano de 1974, formada na Câmara para investigar o tráfico de drogas em Brasília. Ele ouviu de outros colegas jornalistas que a investigação do caso não seria prioridade na cobertura. “A investigação foi mal feita, a imprensa foi proibida de cobrir o assunto e o Ministério Público foi afastado do caso.”

Confira dados resgatados da CPI de 1974.

Silêncio ruidoso

Perto do final do governo militar, em 1982, o processo foi reaberto. “Mas o caso não evoluiu porque tudo foi mal instruído”. A família nunca se comunicou com o escritor nem respondeu os pedidos de entrevistas. Ao ligar o episódio ao silenciamento movido por autoridades, Seabra diz que recebe xingamentos.

“Um dos argumentos que o pessoal usa pra me atacar nas redes sociais é que hoje morreriam mais crianças do que naquele tempo. Se não houvesse impunidade, não estaríamos falando sobre este silenciamento até hoje”.

Seabra entende que a visibilidade é fundamental para a história ao mostrar que a censura é capaz de ocultar direitos básicos de cidadania, como o de encontrar os culpados de um crime. “Eu não quero que meus filhos cresçam achando que Ana Lídia era uma santa. Era uma criança de sete anos que foi assassinada e os criminosos nunca foram descobertos. Um crime contra infância e de gênero.”

A professora de história Joelma Rodrigues da Silva, da Universidade de Brasília, escreveu a tese Amordaçadas e ruidosas, sobre histórias de crianças vítimas de crimes horrendos como o de Ana Lídia e que passaram a ser cultuadas como “santas”. Ela contextualiza que, em maio de 1973, a menina Araceli, de 8 anos, também havia sido estuprada e morta. 

Brasília (DF) 10/09/2023 - Especial Ana Lídia 50 anos. - Professora Joelma. Foto: Arquivo Pessoal/Divulgação

Professora  Joelma Rodrigues da Silva, da UnB, escreveu a tese sobre histórias de crianças vítimas de crimes horrendos – Arquivo pessoal/Divulgação

“Em ambos os casos, pessoas influentes da política foram envolvidas. Trata-se de um ano de violência da ditadura não só no Brasil, mas também na América Latina. A gente tem um contexto de violência e de silêncio. Um silêncio ruidoso. É um silêncio que grita.”

A professora Joelma acrescenta que uma estratégia do Estado ditador da ocasião foi aproveitar o caso de Ana Lídia para investir contra e atribuir culpas a “drogados” e “homossexuais”, e ao final, não prenderem ninguém. “Há suspeitas que caíram sobre filhos de autoridades e, então, desviaram do assunto.”

Diante da ineficácia do Estado, a sociedade, conforme avalia a pesquisadora, passou a santificar essas crianças violentadas e mortas. “Aqui em Brasília, há uma fila de pessoas com presentes para chegar ao túmulo de Ana Lídia. A sacralização dessas meninas mortas acaba servindo à lógica de silenciamento”. No entender da pesquisadora, quando se constrói a imagem de “santa”, a estrutura de impunidade pode ganhar espaço.

Substituição da gotinha na prevenção à pólio aumentará proteção

banner vacina 2


Logo Agência Brasil

 

As gotinhas que entraram para a história da imunização ao eliminarem a poliomielite no Brasil ganharam uma previsão de aposentadoria, e a substituição da vacina oral contra a doença pela aplicação intramuscular significará uma proteção ainda maior para os brasileiros.

Notícias relacionadas:

No último dia 7 de julho, o Ministério da Saúde anunciou que vai substituir gradualmente a vacina oral poliomielite (VOP) pela versão inativada (VIP) do imunizante a partir de 2024. A decisão foi recomendada pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI), que considerou as novas evidências científicas que indicam a maior segurança e eficácia da VIP.

Apesar da novidade, o Ministério da Saúde fez questão de destacar que o Zé Gotinha, símbolo histórico da importância da vacinação no Brasil, vai continuar na missão de sensibilizar as crianças, os pais e responsáveis, participando das ações de imunização e campanhas do governo.

A poliomielite é uma doença grave e mais conhecida como paralisia infantil, por deixar quadros permanentes de paralisia em pernas e braços, forçando parte dos que se recuperam a usar cadeiras de rodas e outros suportes para locomoção. A enfermidade também pode levar à morte por asfixia, com a paralisia dos músculos torácicos responsáveis pela respiração. Durante os períodos mais agudos em que a doença circulou, crianças e adultos com casos graves chegavam a ser internados nos chamados “pulmões de aço”, respiradores mecânicos da época, dos quais, muitas vezes, não podiam mais ser retirados.

A partir dos 2 meses

A vacinação contra a poliomielite no Brasil é realizada atualmente com três doses da VIP, aos 2, 4 e 6 meses de idade, e duas doses de reforço da VOP, aos 15 meses e aos 4 anos de idade.

A partir do primeiro semestre de 2024, o governo federal começará a orientar uma mudança nesse esquema, que deixará de incluir duas doses de reforço da vacina oral, substituindo-as por apenas uma dose de reforço da vacina inativada, aos 15 meses de idade. O esquema completo contra a poliomielite passará, então, a incluir quatro doses, aos 2, 4, 6 e 15 meses de idade.

Crianças são imunizadas na tenda de vacinação instalada na Quinta da Boa Vista para a campanha contra a poliomielite e o sarampo, prorrogada até o dia 22/09 no estado do Rio de Janeiro.

Países de todo o mundo estão substituindo a vacina oral contra a pólio pela inativada – Fernando Frazão/Agência Brasil

A facilidade de aplicação e o baixo custo contribuíram para que as gotinhas tivessem sido a ferramenta para o Brasil e outros países vencerem a poliomielite, explica a presidente da Comissão de Certificação da Erradicação da Pólio no Brasil, Luíza Helena Falleiros Arlant. A comissão é uma entidade que existe no Programa Nacional de Imunizações (PNI) junto à Organização Pan-Americana de Saúde (Opas). Em 2023, o programa completa 50 anos.

“Em 1988, havia mais de 350 mil casos de pólio no mundo. Crianças e adultos paralisados. Naquela época, o que era preciso fazer? Pegar uma vacina oral que pudesse vacinar milhões de pessoas em um prazo curto para acabar com aquele surto epidêmico. Eram muitos casos no mundo todo, uma tragédia”, contextualiza Luíza Helena.

Ciência evoluiu

O sucesso obtido com a vacina oral fez com que a pólio fosse eliminada da maior parte dos continentes, mas pesquisas mais recentes, realizadas a partir dos anos 2000, mostraram que a VOP era menos eficaz e segura que a vacina intramuscular. Em casos considerados extremamente raros, a vacina oral, que contém o poliovírus enfraquecido, pode levar a quadros de pólio vacinal, com sintomas semelhantes aos provocados pelo vírus selvagem.

“Crianças com desnutrição, com verminoses ou doenças intestinais podem ter interferências na resposta à vacina oral. Já a vacina inativada, não. Ela protege muito mais, sua resposta imunogênica é muito mais segura, eficaz e duradoura. Há uma série de vantagens sobre a vacina oral. Tudo isso não foi descoberto em uma semana, foram estudos publicados que se intensificaram a partir de 2000.”

Desde então, países de todo o mundo vêm substituindo gradativamente a vacina oral pela inativada, o que já foi feito por ao menos 14 países na América Latina. A meta da Organização Mundial da Saúde (OMS) é que a vacina inativada substitua a oral em todo o mundo até 2030.

A presidente da Comissão de Certificação da Erradicação da Pólio no Brasil acrescenta que a vacina inativada produz menos eventos adversos que a oral, e também traz maior segurança para a pessoa vacinada e para a coletividade.

Para compreender essa diferença, é preciso conhecer melhor o funcionamento dessas duas vacinas. A oral contém o poliovírus atenuado, isto é, ainda “vivo”, porém enfraquecido, de modo que não cause mais a doença. Já a vacina inativada recebe esse nome porque o vírus já foi inativado, “morto”, e não há mais chances de que possa sofrer mutações ou e se reverter em uma forma virulenta.

Estudos sobre o tema têm se intensificado a partir dos anos 2000, conta Luiza Helena, e constatou-se que o poliovírus atenuado que entra no organismo com a imunização pode sofrer mutações e voltar a uma forma neurovirulenta ao ser excretado no meio ambiente com as fezes. Já se tinha conhecimento dessa possibilidade, pondera a pesquisadora, mas hoje se sabe que ela é mais frequente do que se acreditava.

“Hoje a gente sabe que o vírus mutante eliminado pelo intestino pode acometer quem está do lado, e, se essa pessoa não estiver devidamente vacinada, ela pode ter pólio”, afirma ela, que acrescenta que alguns fatores contribuem para elevar esse risco, como as baixas coberturas vacinais contra a poliomielite nos últimos anos e a existência de populações sem saneamento básico, o que pode provocar o contato com esgoto ou água contaminada por fezes que contêm poliovírus selvagens ou mutantes.

Segundo a pesquisadora, é importante ressaltar que, enquanto


Logo Agência Brasil

 houver poliomielite no mundo, todas as pessoas estão sob risco de


Logo Agência Brasil

 adquirir a doença.

“Os vírus da pólio circulam e podem acometer qualquer pessoa. Se essas


Logo Agência Brasil

 pessoas, especialmente crianças, não estiverem devidamente


Logo Agência Brasil

 vacinadas com uma vacina eficaz, preferencialmente inativada, não


Logo Agência Brasil

 estarão imunes e podem ter a doença.


Logo Agência Brasil

 Mesmo que haja um contato com o vírus, vacinados não desenvolvem a


Logo Agência Brasil

 doença.”

Baixas coberturas

Segundo o Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), as doses previstas para a vacina inativada contra a pólio atingiram a meta pela última vez em 2015, quando a cobertura foi de 98,29% das crianças nascidas naquele ano.

Depois de 2016, a cobertura entrou em uma trajetória de piora que chegou a 71% em 2021. Em 2022, a cobertura subiu para 77%, mas continua longe da meta de 95% das crianças protegidas.

O percentual a que se refere a cobertura vacinal mostra qual parte das crianças nascidas naquele ano foi imunizada. Isso significa que não atingir a meta em sucessivos anos vai criando um contingente cada vez maior de não vacinados. Ou seja, se considerarmos os últimos dois anos, 29% das crianças nascidas em 2021 e 23% das nascidas em 2022 estavam desprotegidas. Como mais de 1,5 milhão de bebês nascem por ano no Brasil, somente nesses dois anos foram mais de 780 mil crianças vulneráveis a mais no país.

As coberturas nacionais também escondem desigualdades regionais e locais. Enquanto o Brasil vacinou 77% dos bebês nascidos em 2022, a cidade de Belém vacinou apenas 52%, e o estado do Rio de Janeiro, somente 58%.

Área livre da pólio

O Brasil não detecta casos de poliomielite desde 1989 e, em 1994, recebeu da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) a certificação de área livre de circulação do poliovírus selvagem, em conjunto com todo o continente americano.

A vitória global sobre a doença com a vacinação fez com que o número de casos em todo o mundo fosse reduzido de 350 mil, em 1988, para 29, em 2018, segundo a OMS. O poliovírus selvagem circula hoje de forma endêmica apenas em áreas restritas da Ásia Central, enquanto, em 1988, havia uma crise sanitária internacional com 125 países endêmicos.

Sequelas

Com a eliminação da doença, é cada vez mais raro conhecer alguém que viva com as sequelas da pólio, mas essa já foi uma realidade muito mais frequente no Brasil. O ator e músico Paulinho Dias, de 46 anos, conta que teve a doença menos de duas semanas após seus primeiros passos, com 11 meses de idade.

Rio de Janeiro (RJ) - Substituição da gotinha na prevenção à pólio aumentará proteção. - Ator e músico Paulinho Dias teve pólio no primeiro ano de vida e vive com sequelas até hoje. Foto:  Arquivo Pessoal

Ator e músico Paulinho Dias teve pólio no primeiro ano de vida e vive com sequelas até hoje – Arquivo pessoal

“A pólio afetou meus membros inferiores. Da cintura para baixo, afetou ambas pernas, porém, a maior sequela foi na perna direita, em que fiz mais de dez cirurgias, entre elas de tendão, de nervo que foi atrofiando e de alongamento ósseo, porque a perna começou a ficar curta, porque não acompanhou o crescimento da outra. Antes dessa cirurgia, quase não encostava o pé no chão.”

Paulinho se lembra


Logo Agência Brasil

 de relatos da mãe de que inúmeras crianças no entorno também tiveram pólio. A falta de informação na época, em 1977, fazia com que muitas famílias buscassem benzedeiras na ausência de outros recursos, dando ainda mais tempo para agravamento dos casos e disseminação do vírus.

“Eu sempre fui a favor das vacinas, mas confesso que nunca fui panfletário em relação a elas até a pandemia de covid-19, que a gente viveu. E também, em pleno século 21, com o risco de a pólio voltar e o risco de outras doenças preveníveis por vacinas voltarem por conta da desinformação, movimentos antivacinistas, medos bobos. Sempre que eu posso, falo para as pessoas se vacinarem, porque é um ato de amor. Vacinem seus filhos, poupem de sofrimento.”

Estado chileno promete assumir busca por desaparecidos na ditadura


Logo Agência Brasil

Nos primeiros anos da década de 1980, os pais de um garoto nascido em Machalí, na região central do Chile, chamavam a atenção dos filhos para uma sepultura sem qualquer identificação existente no Cemitério Santa Inés, de Viña del Mar, cidade litorânea a cerca de 100 quilômetros da capital, Santiago, onde ficava o mausoléu da família do menino. 

“Não havia sequer uma placa com nome”, recorda o atual embaixador chileno no Brasil, Sebastian Depolo Cabrera. “Meus pais nos diziam que um ex-presidente escolhido pelo povo estava enterrado sob aquela tumba anônima e que aquele tratamento não era digno dele.” 

Notícias relacionadas:

O presidente era Salvador Allende, eleito pelo voto popular democrático em 1970 e deposto do cargo por um golpe civil-militar em 11 de setembro de 1973 – cerca de três anos antes de Depolo nascer. 

Defensor da tese de que o Chile poderia chegar ao socialismo por vias institucionais democráticas, Allende morreu no interior do palácio presidencial de La Moneda, resistindo ao ataque dos golpistas que usaram inclusive aviões da Força Aérea e tanques do Exército para bombardear o prédio.

Consumado com o apoio de parte da sociedade chilena e de governos estrangeiros, incluindo os dos Estados Unidos e do Brasil (também, então, sob o regime militar), o golpe levou ao poder o então chefe das Forças Armadas, o general Augusto Pinochet, que por 17 anos comandou forte aparato repressivo, resultando em uma das mais violentas ditaduras latino-americanas. 

Organizações sociais e o próprio Estado chileno calculam que cerca de 40 mil pessoas sofreram abusos cometidos pelo regime. As forças de segurança pública também sequestraram e/ou mataram mais de 3 mil pessoas, das quais ao menos 1.162 mil seguem desaparecidas. 

Só em 1990, ano em que a ditadura chilena chegou ao fim, os restos mortais de Allende foram levados para Santiago. Em 4 de setembro, com a Catedral cercada por uma multidão disposta a se despedir e homenagear Allende, uma cerimônia oficial marcou a transferência da ossada do ex-presidente para o cemitério geral da capital. Depolo estava prestes a completar 14 anos.

“Para mim, isso representa o quanto nos custou reposicionar a figura de Allende como grande líder político democrático, alguém que sempre apostou na viabilidade de promover transformações [sociais] por meios democráticos. Fatos negados por muitos anos”, avalia o embaixador, entrevistado pela Agência Brasil dias antes de o golpe civil-militar chileno completar 50 anos.  

Evento

A data é objeto de extensa programação promovida pelo governo chileno, instituições públicas e privadas e por organizações sociais. Além de exposições – incluindo a do fotógrafo brasileiro Evandro Teixeira, no Museu da Memória e dos Direitos Humanos de Santiago -, marchas, debates, apresentações artísticas e exibição de filmes, há uma série de iniciativas políticas agendadas, a começar pela transformação do Plano Nacional de Busca da Verdade e Justiça em uma política pública permanente.

Na prática, o Estado chileno promete assumir os esforços de busca pelos 1.162 desaparecidos, conforme o presidente Gabriel Boric anunciou em 30 de agosto. Por décadas, as próprias famílias das vítimas da repressão foram os principais responsáveis por tentar localizar os desaparecidos, conseguindo encontrar os restos mortais de 307 pessoas. O plano também estabelece a implementação de medidas de reparação e que garantam o acesso de familiares das vítimas às informações obtidas durante o processo de buscas.

“Não somos movidos pelo rancor, mas sim pela convicção de que a única possibilidade de construirmos um futuro mais livre e respeitoso com a vida e a dignidade humana é conhecer toda a verdade”, justificou o presidente chileno ao lançar o plano nacional. 

Por iniciativa do governo de Boric, um ex-líder estudantil de esquerda, quatro ex-presidentes chilenos (Eduardo Frei Ruiz-Tagle (1994/2000), Ricardo Lagos (2000/2006), Michelle Bachelet (2006/2010 e 2014/2018) e Sebastián Piñera (2010/2014 e 2018/2022) já assinaram documento que ganhou o nome informal de Compromisso de Santiago

Os signatários da declaração se comprometem a cuidar e defender a democracia, respeitando a Constituição, as leis e o Estado de Direito diante de ameaças autoritárias e da intolerância. Também assumem o compromisso de enfrentar os desafios da democracia com mais democracia; defender e promover os direitos humanos acima de quaisquer diferenças ideológicas e fortalecer os espaços de colaboração entre Estados e o multilateralismo. O texto já divulgado termina destacando a importância do cuidado com a memória histórica, “âncora do futuro democrático que nossos povos demandam”. Convidados a aderir à iniciativa, conferindo-lhe um caráter suprapartidário, partidos de direita optaram por lançar seu próprio manifesto. 

Memória 

Sobre a programação dedicada aos 50 anos do golpe de Estado, o governo chileno afirma que a proposta é gerar um “espaço de encontro e reflexão em torno da memória, da democracia e do futuro”. Foram convidadas lideranças políticas de vários países, incluindo o Brasil, que será representado pelo ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida; pelo secretário executivo do Ministério da Cultura, Márcio Tavares, e pelo assessor especial de Defesa da Democracia, Memória e Verdade, Nilmário Miranda, já que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está na Índia, participando da Cúpula do G20.  

Chefes de Estado que já confirmaram presença, como os presidentes do México, da Colômbia, Argentina e do Uruguai, também serão convidados a firmar a Declaração de Santiago durante cerimônia oficial no Palácio de La Moneda, nesta segunda-feira (11). O palácio será aberto à visitação pública, sendo necessário inscrever-se previamente. Locais de todo o país que foram usados como centros de detenção e tortura sediarão diversas atividades ao longo dos próximos dias.  

Para o embaixador Depolo, “datas emblemáticas”, mesmo quando associadas a “trágicas experiências” são oportunidades para as sociedades aprenderem algo mais, “a fim de que fatos semelhantes não voltem a ocorrer”. E há, segundo ele, ao menos três importantes razões para que também os cidadãos brasileiros se inteirem sobre os fatos ocorridos no Chile há 50 anos 

“Primeiro, reconhecer o valor da democracia, que nunca está garantida. E se não a defendemos, outros valores como saúde, trabalho e segurança, também não estarão [assegurados]. Depois, nenhum país vive isolado. Isso ficou evidente na América Latina. Há suficientes evidências histórias sobre como, no contexto da chamada Guerra Fria, as potências estrangeiras participaram da articulação do golpe no Chile. É preciso compreender e lembrar isso. O terceiro motivo é que ninguém, nenhum país, vai produzir bem-estar para as pessoas sem grandes acordos democráticos que impulsionem e sustentem esses avanços”, disse Depolo, destacando as voltas da história. 

“Pessoalmente, isso parece fechar um ciclo. Aos oito anos de idade, tomei conhecimento de que havia um presidente enterrado em uma sepultura não identificada. Quarenta e dois anos depois, há um lugar aonde posso levar minhas filhas e lhes contar sobre o que se passou e quem era Allende. Vou poder lhes dizer o que meu pai não pôde me dizer”, concluiu o embaixador.   

Amistoso da seleção pré-olímpica de futebol em Marrocos é cancelado


Logo Agência Brasil

A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) informou que o amistoso entre as seleções masculinas pré-olímpicas (sub-23) de Brasil e Marrocos, que seria disputado na tarde desta segunda-feira (11), na cidade marroquina de Fez, foi cancelado. O anúncio foi feito pela federação africana devido o terremoto que atingiu o país na sexta-feira (8) e matou pelo menos 2,1 mil pessoas.

A delegação brasileira está concentrada a cerca de 700 quilômetros do epicentro do terremoto, que atingiu 6.8 graus na escala Richter. Apesar da distância, jogadores e comissão técnica relataram terem sentido o tremor, ainda que em segurança.

Notícias relacionadas:

Segundo a nota divulgada pela CBF, a decisão da federação marroquina de cancelar o amistoso desta segunda se deu em razão da comoção nacional pela tragédia. O Rei Mohammed VI decretou três dias de luto. Mais cedo neste domingo (10), chegou a ser anunciado que o jogo ocorreria com portões fechados.

O duelo seria o segundo entre as equipes em Fez. O primeiro foi disputado na última quinta-feira (7), com vitória marroquina por 1 a 0. Os jogos servem de preparação para o Pré-Olímpico de futebol masculino, que será em janeiro. Somente duas seleções da América do Sul se classificam à Olimpíada de Paris, na França. O Brasil é o atual bicampeão da modalidade.

Apoio

A Embaixada do Brasil em Rabat, capital de Marrocos, pode ser contatada pelo telefone +212 661 16 81 81 (inclusive WhatsApp). Outro canal é o plantão consular do Itamaraty, no telefone +55 (61) 98260-0610 (também Whatsapp). Não há notícias de brasileiros entre as vítimas da tragédia.
 

Com 600 mil visitantes, Bienal do Rio vende 5,5 milhões de livros


Logo Agência Brasil

Mais de 600 mil pessoas passaram pelo Riocentro, na Barra da Tijuca, zona oeste da capital fluminense, na edição comemorativa de 40 anos da Bienal do Livro, que terminou neste domingo (10). Cerca de 5,5 milhões de livros foram vendidos, segundo balanço apresentado hoje em coletiva de imprensa. 

Em 2019, foram comercializados aproximadamente 4 milhões de livros e, em 2021, em edição reduzida em função da covid-19, o número de livros vendidos na Bienal do Rio de Janeiro alcançou 2,5 milhões de exemplares. A média anterior de seis livros por pessoa foi superada, atingindo nove livros comprados por visitante.

Notícias relacionadas:

“Esse é o Brasil que a gente quer”, salientou a diretora da GL events, Tatiana Zaccaro, responsável pela organização da feira. O presidente do Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel), Dante Cid, acrescentou que todos os segmentos foram bem-sucedidos. Ele destacou o empenho dos organizadores em tornar o evento “mais diverso e inclusivo” possível, com representantes de toda a sociedade brasileira.

Na avaliação dos organizadores, a Bienal se consolidou como o maior festival de literatura, cultura e entretenimento do país, estimulando o hábito da leitura não só entre crianças, mas também entre os jovens. “A Bienal é um patrimônio do Rio de Janeiro”, apontou Tatiana Zaccaro. Para Dante Cid, o evento cumpriu o papel de demonstrar a preciosidade que é o livro.

Tatiana lembrou que mais de 100 mil crianças de escolas da rede pública visitaram o evento e, muitas delas, adquiriram um livro pela primeira vez, graças aos cartões distribuídos com essa finalidade para estudantes e professores pelas secretarias municipal e estadual de Educação. Os investimentos com essa finalidade somaram R$ 13,5 milhões. 

Rio de Janeiro (RJ), 10/09/2023 – Público durante o último dia da 20ª Bienal do Livro do Rio de Janeiro, no Riocentro, na Barra da Tijuca, zona oeste da capital fluminense. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Público durante o último dia da 20ª Bienal do Livro do Rio de Janeiro, no Riocentro, na Barra da Tijuca, zona oeste da capital fluminense. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Movimento

Foram dez dias de ruas movimentadas, alegria por encontrar os autores preferidos e pessoas saindo da feira com sacolas cheias de livros. Os painéis da Bienal ganharam, nesta edição, novos formatos e espaços para o público apaixonado por histórias. Com mais de 497 editoras, selos e distribuidoras e uma diversidade de títulos, o tíquete médio de gastos com livros ficou em torno de R$ 200.

“Estamos falando do livro como ponto de partida ou chegada, a partir de uma transversalidade com os mais diversos tipos de mídia, porque os assuntos tratados no livro físico também viram séries, filmes, games, música, e isso garante que as histórias possam atrair mais pessoas formando novos leitores, já que o livro é sempre o protagonista”, ressaltou Tatiana.

Com área ocupada de 90 mil metros quadrados, 10% maior que na edição de 2019, no período anterior à pandemia da covid-19, a Bienal 2023 recebeu mais de 380 autores na programação oficial.

Rio de Janeiro (RJ), 10/09/2023 – Público durante o último dia da 20ª Bienal do Livro do Rio de Janeiro, no Riocentro, na Barra da Tijuca, zona oeste da capital fluminense. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Público durante o último dia da 20ª Bienal do Livro do Rio de Janeiro, no Riocentro, na Barra da Tijuca, zona oeste da capital fluminense. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Novidades

As crianças que visitaram a Bienal encontraram um universo lúdico chamado Uma Grande Aventura Leitora, em um espaço de 600 metros quadrados. Ali, foram comemorados os 60 anos da personagem Mônica, da obra do escritor e ilustrador Maurício de Sousa. 

Outra novidade da Bienal foi o Baile de Máscaras da Julia Quinn, promovendo uma festa de época como ocorre nos episódios de Os Bridgertons, sucesso dos livros da autora inglesa que viraram série em vídeo. “O público curtiu e veio fantasiado para participar do baile”, relembrou Tatiana Zaccaro.

A Bienal 40 anos lançou o espaço Páginas na Tela, com curadoria da cineasta e escritora Rosane Svartman, e Páginas no Palco, coordenado por Bianca Ramoneda. São formatos que se cruzam entre livro, audiovisual e teatro. No Sextou com Simas, o professor e autor Luiz Antonio Simas recebeu convidados, transformando o Café Literário em um verdadeiro boteco carioca. Neste espaço, a curadoria recebeu autores como Ailton Krenak e Conceição Evaristo.

Os fãs de histórias em quadrinhos tiveram a oportunidade de conhecer ao vivo quadrinistas independentes de todo o Brasil no novo espaço batizado Artists Alley. A Bienal foi palco também do Rio International Publishers Summit, promovido pelo Snel, com objetivo de conectar os protagonistas do mercado editorial e discutir temas urgentes para o setor. O fórum tratou dos desafios da transformação tecnológica, uso da inteligência artificial e preservação do direito autoral, entre outros temas.

Terremoto: “Eram blocos de rocha caindo sobre pessoas”, conta geólogo


Logo Agência Brasil

Era fim do jantar e a equipe do Geoparque de Seridó, do Rio Grande do Norte, aguardava um táxi, quando sentiu o chão tremer “meio que em ondas que vibravam”.

“A gente se abrigou na praça. Sentimos pela segunda vez outro abalo de menor magnitude e um mais leve, no final”. Quem traz o relato é o geólogo Marcos Nascimento, do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e coordenador científico do Geoparque Seridó.

Notícias relacionadas:

Ele e mais três integrantes da comitiva do parque estavam em Marrakech, no Marrocos, no momento em que a cidade foi atingida por um terremoto de magnitude 6.8 na escala Richter no último dia 8. O grupo participava da 10ª Conferência Internacional de Geoparques Mundiais da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

O geólogo conta que, por todo lado, ouviam-se sirenes e viam-se comboios de ambulâncias. O número de mortos já passa de 2 mil, conforme últimos dados do governo local.

Nascimento explica que a cidade de Marrakech fica próxima da região das altas montanhas, chamada Alto Atlas, onde há o encontro de duas placas tectônicas, da África e da Europa. Essas placas colidiram-se, provocando o forte tremor no país, localizado no norte da África, por volta das 23h20 (19h20 no Brasil) da última sexta-feira. A medina, onde estão as construções mais antigas e importante ponto turístico, foi a área mais afetada de Marrakech.

“Não são preparadas [as construções] para esse tipo de impacto e muitas foram demolidas. Com isso, se gerou um caos, porque eram blocos de rocha caindo sobre pessoas, sobre casas e carros. E a gente lá, no meio de tudo isso”, relata Nascimento à Agência Brasil.

Marraquexe, Marrocos -  O terremoto aconteceu no último dia 8, na cidade de Marrakech, no Marrocos, onde a comitiva do Geoparque Seridó (RN) participada de uma conferência da Unesco. Foto: Geoparque Seridó

 Marrakech (Marrocos) – Terremoto destruiu cidade e já matou mais de 2 mil pessoas. Foto: Equipe Geoparque Seridó

Após o terremoto, a equipe entrou em contato com as demais comitivas brasileiras e soube que todos estavam bem. O grupo do Geoparque Seridó deixou o Marrocos e já está em Portugal para missões técnicas. Eles regressam a Natal no próximo sábado (16).

Ajuda

Com o cancelamento das atividades da conferência em razão do terremoto, os conferencistas participaram de mutirões para ajudar a população local, com doação de sangue e dinheiro. “Houve também doação de dinheiro de quem pagou inscrição para participar da excursão que seria realizada hoje e teria direito à devolução do dinheiro. Essa doação foi para ajuda humanitária na região de Marrakech e no entorno”, disse.

A conferência reuniu 195 geoparques mundiais da Unesco de cerca de 50 países.